segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

A dois


Tem música, gente, bebida, olhares, galanteios e saias coloridas balançando na brincadeira de tocar de leve as pele sensível das mulheres. Tem eu, no salto, no perfume, no desejo e no coração brincando de São Silvestre. E nem balancei minha saia ainda. E nem vi seu sorriso de canto, escondido de mim e do mundo. Nem vi onde meu ar foi parar quando entrei. Vi a pista, vi os músicos e vi a mim vagando pelo espaço meio cheio, meio vazio, meio meio. Alguém me tocou o ombro e pediu “vamos abrir os trabalhos?”. E, ao ver aquele par de olhos âmbar, abri trabalhos, sorrisos, abraços e pernas para encaixar seu par de pernas, braços, olhos e intenções.
Carregá-la pelo salão é a coisa mais fácil do mundo.  Ela é entregue, confiante. Tão confiante que eu me pergunto se me deixaria levá-la pra longe dali, para uma dança nova, com tecido quase acrobático. Mantenho-me firme para que nada mais abaixo resolva ficar firme também. Quando ela dança, ela não conversa muito, às vezes solta uma risada quando erra o passo, mas já gruda no meu peito outra vez e sai balançando o vestido por aí. Ela me dá calor. Pelo ambiente, pela dança, pelo corpo que ela cola no meu, pelas coxas que abraçam a minha perna e por esse tesão do caralho que ela me dá.
Sempre acho que depois de dançar com ele saio de rímel borrado e cabelo em pé. Porque apoio meu rosto no peito tentando me acalmar e tentando arrumar um só eixo pros giros, e ele encosta o rosto no topo da minha cabeça. Aposto que fecha os olhos, já o vi dançando assim. Aliás, nem olho muito, porque quando o vejo dançar perco o passo. Perco o ar e perco os sentidos querendo ser eu a me emaranhar por aquele abraço gigante. Dançando com ele eu relaxo as mãos e o seguro pelo pescoço. Sinto uma corrente fina pela palma da mão. Curioso como os homens que mais me provocaram suspiros e disritmias usavam uma corrente no pescoço. Geralmente escapulário. Geralmente presente da mãe. E, essas correntes, ficavam mais encantadoras ainda quando deitados e sobre mim, a corrente me roçava os lábios e se balançava pra frente e pra trás.
Na salsa, ela mexe os quadris como se não tivesse ossos, não tivesse vergonhas, não tivesse ninguém. Mas sempre achei que mesmo que ela estivesse dançando aqueles ballet com saia cor de rosa e coque no cabelo, os olhos ainda teriam aquele tom profundo capaz de engolir inteiro, como se você estivesse nu e sozinho e ela, tirana maldita, ri da sua vergonha enquanto os olhos secam cada pedaço de pele exposta. Ela dança sempre de olhos fechados e, quando a música a agrada, sorri. Mas não encosta no pescoço. Isso ela só faz quando se prepara para o bote. O meu, ela já brincou de deslizar a mão diversas vezes. Uma, duas, direita, esquerda. É tanta pele na pele que se fizer exame DNA dá confusão. Tem eu e tem ela ali no meio. Tem tanta coisa que o bioquímico vai pedir demissão. Vai achar que é criação nova e vai fazer o sinal da cruz. E não tem nada de novo. Tem só gente querendo se fundir numa coisa só.

A música diminui de ritmo e deixo as duas mãos no pescoço dele. Meus pés mal saem do chão e os quadris ele guia no balançar das pernas grossas. A coxa entre minhas pernas me roça a pele devagar, e o tecido leve do vestido ameaça me descobrir e diminuir os entraves entre o corpo dele e o meu.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Mercadoria

São 00h23 e o estacionamento do teatro já está vazio. Por perto, alguns homens cheirando a botequim barato e mulheres buscando renda. Saia curta, botas de cano longo, batom vermelho nos lábios, esmalte descascando e uma pequena bolsa. Com olhar de malícia, ela observava os carros passando. “Gostosa”. “Se te pego, te rasgo inteira, delícia”. Ela sorri e espera pacientemente. Outras donzelas de calçada entram em carros de todo tipo e somem na noite florianopolitana.  Alguns carros param, perguntam o valor do programa e ela rejeita. Ainda não é hora. Não esses homens. Não pra ela.
Um peugeot 308 dobra a esquina lentamente e ela sorri. Lá dentro está o parceiro de diversas aventuras sexuais. Exploraram juntos praias, motéis, barracas, piscinas e elevadores. Quando ela fez a proposta de ser puta por uma noite, ele encheu os lábios com um beijo forte e disse ‘pago qualquer valor pra te ver rebolando’. O carro para e baixa o vidro do motorista. “E aí, quanto?”. “O completo é 200”. “E quem garante que essa boca é gostosa?”. Ela sorri, inclina-se para dentro do carro, abre o zíper e o chupa ali mesmo, sem esperar que ele responda ou reaja. Ainda escuta um ‘vagabunda’ soprado diante da surpresa. “Entra”. “Tem que pagar agora”. “Entra, porra”. Ela passa pela frente do carro, arrastando a mão pelo capô, e mergulha no banco do carona. Ele enfia quatro notas de cinquenta no decote e sai noite adentro.
Antes que ele pudesse contornar a centenária figueira da praça XV, ela se inclina e começa a chupá-lo devagar. Ela sabe que precisa ir com calma enquanto ele estiver dirigindo, principalmente porque, para incorporar a personagem, ele dispensou o uso dos óculos.
Diferente das chupadas das transas casuais, dessa vez ele não acaricia os cabelos. Enfia a mão pela minúscula saia. A calcinha já esta completamente molhada e ele a empurra para o lado sem demora. Encosta um dedo no clitóris e começa a estimulá-la de volta. Ela geme e chupa aquele pau delicioso com mais vontade.
Ele, sem avisar, resolve passar por um drive thru. Quer que todos vejam a submissão daquela mulher, como a fome invadia os olhos e o calor dentro do carro não deixava dúvidas da programação noturna. Ela se recompõe e, enquanto o atendente anota o pedido, retoca o batom. Pegam a comida e partem para o motel.
Quando ele estaciona, ela pede para recuar o banco e senta no colo dele. “Eu disse que era completo. Começamos no carro”. Tira a camisa dele e faz uma trilha de beijos molhados pelo pescoço, ombro e peito. Ele se reconforta entre os seios e aperta a fina cintura com vontade. Ela já estava tão molhada e ele tão duro que foi fácil cavalgar naquele pau dentro do carro. Os vidros embaçavam e o carro se movia no ritmo que ela ditava. Por ora, ela era dominante.
Dentro do quarto, ele a joga na cama sem cerimônia. Apesar de ali não ser exatamente a sua parceira, aprendeu que aquela mulher é dura na queda. Pode bater, jogar de um lado para o outro que ela não quebra. Ao contrário, ri e pede por mais. Ela o puxa para a cama pelo cós da calça pendendo frouxa no quadril dele. Prende a mão dela acima da cabeça com as próprias mãos e sai beijando aquele corpo que ele já tinha decorado há meses. Ela gemia feito uma louca e debatia as pernas de tesão. Ele morde a barriga e distribui beijos pela coxa e virilha. Arranca botas, saia e calcinha em poucos segundos. Com os pés, ela empurra a calça e a cueca para longe. Senta-se de frente pra ele e deixa que ele dê o ritmo da segunda foda da noite. Ele agarra os cabelos e beija o pescoço com força. “Vagabunda, piranha, cachorra, puta. Minha puta, eu paguei, é minha entendeu?”. Em resposta ela só gemia.
Em seguida vem o primeiro, segundo e terceiro orgasmo dela. O corpo entrava em estado de êxtase e ela tremia, gritava, quase chorava agarrada aos braços dele. Ele metia forte porque sabia que ela não tinha forças para continuar, mas o mataria se ele parasse. E aí veio mais um orgasmo, fazendo-a desabar para o lado e murmurar um ‘puta que pariu’ com o rosto enfiado no colchão. Ele a puxa para o quadril, segura pela cintura e a fode de quatro: a posição favorita dele e que ela, submissa, executa com louvor. Rebola e pede por mais. ‘Fode tudo, rasga que é tudo teu’.
Aquela mulher já o faria suar em pleno Ártico. Dentro daquele quarto, ela era oásis. Ele podia – e fez – tudo que tinha vontade. Deleitou-se com os sabores da moça, soube aproveita-la ao máximo e, quando ela estava perto de desabar, ele segurou o rosto dela com firmeza e disse “agora eu quero esse cu, e eu vou gozar nele”. Encaixou-se perfeitamente atrás dela e sussurrava ao pé do ouvido obscenidades que faziam ela mexer o quadril cada vez mais forte. Uma mão ele estimulava aquela buceta que ainda latejava, enquanto a outra mantinha o corpo dela bem próximo. Ele geme, grave e contido, e aí ela sabe que ele vai gozar. Empurra o quadril com mais força e diz “solta essa voz, gostoso. Quero te ouvir”. Ele deixa o gozo e o gemido virem a tona, que provocam outro orgasmo nela, dessa vez muito mais forte que os outros. Uma mistura de prazer, dor e uma sensação que aquilo tudo não cabe dentro dela. Faz todo sentido o nome ‘petit mort’ dado pelos franceses.
Ainda ficam alguns segundos parados, deitados banhados em suor, saliva e gozos. Ela tem a mão entrelaçada na dele e ele esconde o rosto pelos cabelos castanhos. É o único momento em que as personagens puta e garanhão se desfazem e a cumplicidade escapa pela brecha aberta pelo cansaço.

Ele a deixou em casa perto do amanhecer. Despediram-se com um beijo breve e um tapa na bunda. Quando ela chegou no apartamento e desabou na cama, o celular tocou. Na tela, uma mensagem dele que dizia: “adorei nossa aventura. vc é a puta mais deliciosa que já comi, mas acho q o dinheiro q te dei devias nos pagar um sushi. Te encontro daqui algumas horas no café. GOS-TO-SA!